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«Até Sempre» , foi o título que mais se ajusta a uma despedida de mandatao autárquico em uma das maiores autarquias do País, onde tive enorme prazer em servir, mas também angustias várias. Foi uma prolongada declaração. Mas o momento e a actualidade impunha.
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Cumprem-se os
derradeiros dias deste Mandato Autárquico (2009-2013).
Eu despeço-me. Não
estarei aqui nos próximos quatro anos. Nem sei se algum dia aqui regressarei.
Tentarei ser um cidadão de Odivelas, atento com sentido do dever da crítica
construtiva, mas também exigente para que não se repitam tantas Assembleias de
Freguesia estorvadas:
v
Por
diferendos pessoais e interesses partidários;
v
Por
discordâncias ideológicas que ultrapassam os assuntos da cidade de Odivelas e
as preocupações dos seus cidadãos que abrem espaço à discussão de decisões de
âmbito político nacional e –imagine-se – até internacional, que em nada
interferem ou beliscam os interesses dos nossos eleitores.
Começo por agradecer a
todos os funcionários da Junta de Freguesia de Odivelas que desempenham as suas
funções com sentido da prestação do serviço público, dedicação, rigor e
competência, pilares fundamentais a qualquer profissão seja ela exercida no
sector público ou privado.
Estou capacitado que
estas características se estendem à maioria dos que trabalham na Junta de
Freguesia de Odivelas, para corresponderem ao bem necessário à comunidade da
Cidade de Odivelas.
Serão poucos os que não
o fazem. Mas para esses deixo um apelo:
O trabalho profícuo
deixa-nos mais felizes, no final de cada dia de trabalho; enche-nos a alma
porque nem demos pelas horas de trabalho, por vezes de grande dificuldade.
O trabalho produtivo torna-nos dignos!
Para quem segue o desempenho destes “actores” do
serviço público é legítimo fixar os bons exemplos e felicitá-los. Recordo aqui
um dos muitos bons exemplos: Precisamente, há quinze dias, às 07 horas e 45
minutos, a cantoneira Eduarda Santos, limpava os sumidores desta rua, aqui
mesmo em frente desta sala onde nos encontramos reunidos (a Rua Aquilino
Ribeiro). Fazia-o a preceito e sucedia o impensável: Enchia um caixote do lixo
do seu carrinho-de-mão por cada escoador limpo, tal é a quantidade de lixos que
a maioria dos cidadãos joga no chão ou deitam fora pelas janelas dos seus
carros, papeis e invólucros de tabaco ou alimentos amachucados, garrafas de
água espalmadas e outros detritos... Tudo misturado numa surpreendente
argamassa composta por folhagem. Eduarda Santos puxava pela força que tem nos braços
porque, passo a citar: «O Verão está quase no
final e aproximam-se as primeiras chuvas e é importantíssimo que as ruas não se
inundem por nada. Já basta quando a chuva é demasiada».
Despeço-me na esperança de quem aqui estiver no
próximo Mandato, bem como no Executivo desta Junta de Freguesia de Odivelas,
respeite quem trabalha com dignidade e
empenho, a troco de um salário que me atrevo a afirmar de miséria que nenhum
dos Eleitos políticos que aqui se encontram jamais aceitariam.
Porque não aceitam sair da zona de conforto que as
vossas políticas alimentam. É demasiado fácil ignorar o voluntariado também
exigível à defesa da coisa pública e proferir discursos ao microfone, sempre na
esperança de que o povo os siga.
Por isso, esta noite, expresso a minha gratidão
àqueles que ajudam os cidadãos da Cidade de Odivelas, tantas vezes sem
encontrarem uma decisão assertiva para o fazer. Podem ficar conscientes que nos
últimos 4 anos, esta Assembleia de Freguesia não soube fiscalizar o Executivo
da Junta. Raramente saiu à rua para ovir os cidadãos ou os trabalhadores da
autarquia. Somente o fazem perto dos militantes dos partidos que representam,
ignorando a comunidade que não tem filiação ou crenças políticas. Antes, espera
por quem lhes mostre o caminho da esperança.
MÃO CHEIA DE
QUASE NADA
Voltei à vida política 33 anos depois, 35 anos
passados sobre a Revolução de Abril, de 1974.
Acreditava encontrar um País politicamente evoluído,
culto, intrinsecamente virado à defesa da coisa pública, dos cidadãos que são
eles o Estado, os únicos contribuintes capazes de fortalecer a Nação cultural,
social e económica.
Esperava encontrar políticos capazes deste nobre
entendimento, desta dignidade, profícuos nos exercício das suas funções que
lhes foram confiadas pelo voto dos eleitores, mesmo quando apenas e só,
confinadas à regência de uma Assembleia, ao contributo de legislar, sobre a
fiscalização do exercício de um Executivo.
Não esperava encontrar convergências ideológicas.
Mas vaticinava a comunhão de soluções para as dificuldades dos cidadãos, ainda
e sempre por ultrapassar, independentemente dos melhores ou piores momentos em
que vivemos há demasiadas décadas.
Acreditei encontrar eleitos capazes de um enorme
voluntariado em acolher as enormes vicissitudes da vida dos menos afortunados:
As crianças e jovens em risco, dos idosos que vivem na dependência de reformas
tremendamente baixas, dos que vivem abaixo do limiar da pobreza, dos que vivem
do flagelo do desemprego que penhora dezenas de anos de trabalho, entregando as
suas casas aos credores e outros bens.
Nada mais errado. Nestes últimos quatro anos deparo-me:
v Com uma mão cheia de quase nada;
v Com mesquinhez absoluta;
v Com um autoritarismo transversal;
v Com um reino de senhores feudais;
v Com aguerridos defensores de causas próprias;
v Com Eleitos que usam a coisa pública unicamente em benefício próprio ou
de um grupo de actores restrito, no teatro da vida política;
v Com Eleitos que renunciaram aos mandatos, para poderem auferir de
benefícios financeiros de milhares de euros, por ano, pagos pelos
contribuintes, a troco de nada, de apenas sancionarem acordos de poder;
v Com uma sociedade política fortemente bipolarizada entre os dois maiores
partidos, o Partido Socialista (PS) e o Partido Social Democrata (PSD), que se
assumem como únicos donos da verdade, ignorando outros agentes sejam ou não
partidos políticos ou associações de cidadãos;
v Com uma crise económica e de valores quase extrema, que motiva um maior
número cada vez maiores de famílias destruturadas, de crianças e idosos
excluídos, de maiores obstáculos à assistência médica;
v
Com uma cidade de Odivelas
(também um concelho) onde se anuncia a morte lenta das economias familiares, o
maior suporte da actividade social e económica da Freguesia, onde a taxa de desemprego aumentou em
mais de 58% em escassos 3 anos, entre Dezembro de 2009 e Dezembro de 2012,
enquanto a média nacional (Portugal Continental) cresceu em 30,4%;
v
Com
uma cidade de Odivelas que não é notícia por causas dignas. Ou é pelos piores
motivos ou porque se receberam prémios disto e daquilo, mas que não se traduzem
em qualidade. Vejamos o exemplo da Escola Braamcamp Freire, na Pontinha, que
recebeu um prémio de arquitectura, mas onde chove dentro de alguns espaços.
Do
Executivo desta Freguesia - ainda segunda maior do País, com a dimensão
superior a muitos municípios portugueses - opto por guardar:
v
O
cumprimento das metas na área social, dos apoios prestados no auxílio aos mais
desfavorecidos. São as próprias instituições que se encontram no terreno que o
afirmam;
v
O
apoio e realização de eventos desportivos de alguma projecção;
v
De
ter ombreado, por duas vezes, com os melhores cartazes nacionais de
espectáculos musicais de Verão, ainda que sob uma estratégia de marketing pobre
e preconceituosa, para quem pretendeu criar um contraciclo à crise do País;
v
Os
sobressaltos e inabilidade na organização das Festas da Cidade;
v
A
inquietação da gestão da própria autarquia;
v
O
declínio na qualidade da manutenção do espaço público, particularmente nos
espaços verdes, a demonstrarem claramente a péssima opção na contratação de
determinados prestadores de serviços, sobretudo quando também são as mesmas
entidades a servir a Câmara Municipal, e se transgride a uma verdadeira luta de
interesses que não são os da população;
v
A
instabilidade no Executivo, motivada pelo desacordo do acordo de poder entre o
PSD e o PS, aqui ao contrário do que sucedeu no Município, onde quem abençoa os
disparates, são os vereadores e deputados municipais sociais-democratas, do
PSD.
Estes quatro
anos na vida pública lançaram-me ainda outros constrangimentos:
A dificuldade em se entender que uma coisa é criticar os
decisores políticos sejam quais forem, de preferência construtivamente e sempre
apoiado em factos ou acontecimentos. Completamente diferente e moralmente incorrecto
é faltarmos ao respeito aos dirigentes das instituições para quem trabalhamos.
Importa separar estes costumes, sem qualquer necessidade de submissão!
E termino
recordando dois pensamentos, simples e pertinentes que aqui deixo para que
todos possam reflectir:
v Do democrata-cristão João Távora, que
passo a citar - «que para lutarmos pelas nossas convicções não é obrigatório sermos
todos Assessores, Deputados, Vereadores, Ministros ou Secretários de Estado.
Acontece que, mesmo que os aparelhos partidários não nos queiram lá, é nesse
espaço intermédio de cidadania que todos somos poucos e onde fazemos mais
falta.»;
v Do cientista e poeta alemão Johann
Goethe que viveu entre 1749 e 1832. Cito: «Onde é mais intensa a
luz, maiores são as sombras».