Muitos dos académicos portugueses continuam a não conseguir acompanhar as repentinas mudanças de arquétipos. Por exemplo, perceber uma coisa tão simples como o facto da velocidade da informação ter aumentado 32 vezes em escassos quatro anos. E que isto significa que o elemento técnico e prático continua a merecer mais respeito que uma simples teoria construída no final da revolução industrial ou no pós-II Grande Guerra. Hoje, as filosofias que se estudam servem para nos aumentar a bagagem cultural e não tanto melhorar a nossa confrontação com a realidade.
Dissertar sobre uma qualquer teoria, mesmo que suportada em números meramente estatísticos, não significa qualquer solução. Afirmar, como sendo extraordinário, que os países asiáticos representam mais de 60% do PIB do planeta só nos pode confirmar a perplexidade com que devemos viver. Só por ignorância se poderá escamotear que estas economias, ditas emergentes, sobrevivem com cerca de 30% da mão-de-obra a ganhar uma média de 2,7 dólares por dia. Sendo que num total de 42% subsistem com menos de 150 dólares mensais. Também se sabe que mais de 10% do PIB destes países é conseguido com trabalho infantil, entre os 8/9 anos e os 12/14 anos.
Acreditar que este é o grande desafio da Europa é escamotear realidades seculares de uma Europa que só encontrou maior período de paz, após a II Guerra Mundial e, que jamais ultrapassará diferenças culturais, raciais e até algumas religiosas. A Europa nunca será competitiva porque não é capaz de se tornar num Estados Unidos da América, onde se trabalha num único sentido, independentemente da múltipla culturalidade dos seus 308,7 milhões de habitantes. Também a indústria europeia baixou índices de produção, particularmente nos sectores de maior empregabilidade, dando lugar aos serviços e a algumas tecnologias, incapazes de absorver as disponibilidades do mercado de trabalho.
É claro que as nossas convicções também se constroem pela oportunidade que, cada um de nós, aproveita quando sai das fronteiras na procura de conhecer as outras realidades, ou a outra face das leituras que escolhe daquilo em que realmente acredita. Bom exemplo é o texto que se segue, um trecho de uma tese de uma amiga muito especial.
“A globalização encerra em si profundas reflexões em quase todas as facetas da vida humana. A globalização criou a necessidade dos humanos e, particularmente de quem detém o poder, repensar questões fundamentais no âmbito social, económico, cultural e religioso, principalmente nas questões relacionadas com o foro jurídico, saúde, produtividade e agricultura.
Em linguagem simplista, a globalização é vista na maior parte das vezes como significado de: mercado livre, liberalização económica, “ocidentalização”, “americanização”, proliferação das novas tecnologias de informação (com especial destaque para a “Revolução da Internet”).
Mas a globalização é ou deveria ser muito mais que estas generalidades: um processo para fazer interagir e integrar pessoas, empresas e processos que impulsionem, sobretudo pela via do comércio tradicional e eletrónico (com o auxílio das tecnologias da informação), o investimento internacional à escala planetária
Naturalmente como atrás se explicita, este processo tem efeitos ambientais, culturais, políticos, económicos e mexe com a prosperidade dos povos.
É claro que a Globalização é muito mais que apontar a simples evolução tecnológica das últimas décadas como responsável do extraordinário fluxo de aumento do comércio transfronteiriço e consequente disparo na migração que leva alguns dos mais consagrados observadores a acreditarem que o mundo já entrou numa nova fase qualitativa quanto ao seu desenvolvimento económico.
Se é verdade que entre 1997 a 1999 os fluxos de investimento estrangeiro quase duplicaram (de 468 biliões para 827 biliões de dólares), não será menos verdade que essas correntes de dinheiro não beneficiaram a comunidade internacional ao contrário do que faz acreditar Thomas Friedemann.
Transporte marítimo, o mais universal
Ausências de fronteiras económicas só existem na Europa Comunitária, no continente Norte-americano (Estados Unidos com o Canadá) e entre a Austrália e a Nova Zelândia (neste último caso fronteira marítima).
As mercadorias transportadas por caminho-de-ferro só aumentaram precisamente na grande Europa e no continente Norte-americano… Mas muito mais por força, da cada vez maior aposta neste tipo de transporte que pode ser transcontinental por três razões absolutas:
Segurança;
Rapidez;
Eficácia energética.
Na Europa Central e do Norte, incluindo o centro e Norte de Itália, mais de 80% das mercadorias são transportadas por comboio.
O caminho-de-ferro só não tem maior expressão transcontinental particularmente entre a Europa e a Ásia Central por questões meramente políticas que motivam os conflitos de interesses e armados que se conhecem.
Precisamente aos mesmos problemas se fica a dever o menor desenvolvimento do transporte ferroviário na América Central e nos continentes Sul-americano e africano.
Podemos considerar que o transporte marítimo foi o que mais se desenvolveu com a globalização.
Foi sem dúvida o que mais se globalizou tanto no conceito como na tecnologia. Forçou mesmo que alguns países pobres em melhorassem as suas infra estruturas portuárias.
De qualquer forma, os países menos desenvolvidos acabaram por realizar maiores investimentos neste sector também porque perceberam que era a única forma de poderem escoar os seus produtos. Observemos que os países subtropicais e tropicais que produzem um conjunto de produtos agrícolas de grande consumo ocidental e quase únicos responsáveis dos seus PIB, as verdadeiras receitas de cada um destes países.
O mesmo se coloca aos países produtores de petróleo cuja alternativa foi adaptarem-se às novas exigências quer estruturais quer tecnológicas das instalações portuárias, neste caso por razões que se prendem fundamentalmente com questões ambientais e de segurança. Mesmo assim a globalização não equiparou estas instalações ao nível planetário – os países mais ricos continuam a apostar muito mais “dentro de casa” do que no investimento exterior.
Globalização não aproxima ricos e pobres
A globalização não espalha modernização. Apenas revoluciona as tecnologias de informação e comunicação
Mas a globalização está distante dos objetivos.
Metade dos líderes de opinião, entendem que a globalização é a maior responsável pelas cada vez maiores assimetrias entre o Norte (sempre mais rico independentemente das crises dos mercados de capitais) e o Sul cada vez mais pobre e envolto em conflitos regionais.
A globalização é verdadeiramente responsável por alguns dos vários falhanços internacionais, independentemente da crise financeira jogada nas principais praças financeiras pelos maiores intervenientes nos mercados financeiros:
Experimentação industrial com resultados fabulosos no sector automóvel onde se utilizam peças iguais em milhares de modelos e onde a qualidade se discute na montagem dos produtos ou nos pergaminhos das marcas, o que permite a desmobilização a curto prazo para países com mão-de-obra mais barata (salvo raríssimas exceções, o caso das marcas mais socializantes como a Daimler-Benz, Fiat, Toyota);
Também resultados fantásticos na indústria farmacêutica e correlacionada com a alimentar, através dos antibióticos genéricos (destaque para as vacinas humanas e animais) e nos alimentos transgénicos com destaque para os cereais sem resultados práticos para as populações mais carenciadas que não vêm a resolução da questão da fome;
Uniformização dos sistemas Ocidentais militar;
Domínio dos mercados financeiros;
Domínios das empresas mais importantes de extração estejam a Norte ou a Sul do hemisfério;
Menor partilha da tecnologia de ponta, sobretudo no capítulo da investigação, mesmo sabendo-se da velocidade da notícia pelos atuais meios de comunicação…
Os países mais ricos continuam a pagar mais e dar melhores condições aos melhores profissionais de qualquer área.
Sob o símbolo da globalização os países mais industrializados incrementam vendas nos países terceiros, onde até alimentam algumas fábricas de componentes mas sem grande tecnologia, ou seja por via de equipamentos que serviram nas unidades europeias ou Norte-americanas há uma ou mais décadas;
A globalização serviu também para inflacionar produtos bolsistas, sobretudo ao nível das matérias-primas e dos produtos imobiliários.
A atual onda da globalização tem sido impulsionada pelos políticos mais liberais convencidos que alguma libertinagem de regras promove o mercado livre, aumentando substancialmente o seu potencial produtivo e criando inúmeras novas oportunidades para o comércio internacional e investimento.
Veja-se o caso da construção civil do Dubai onde um trabalhador médio com mediana certificação ganha pouco mais de 2 dólares diários e vive dentro de um contentor de transporte marítimo.
É claro que ninguém tem dúvidas que a tecnologia tem sido o principal condutor da globalização, principalmente a que respeita à informação que têm fornecido poderosas ferramentas aos agentes económicos para identificar e captar oportunidades que facilitam quase unicamente a transferência de ativos.
Ajuda humanitária globalizada não é fiscalizada
Mas o fenómeno é cada vez menos pacífico se atendermos às intervenções das chamadas organizações humanitárias sejam elas de carácter oficial como as Nações Unidas ou as ONG’s (organizações não governamentais) nas zonas de conflito armado, sobretudo onde se jogam pesos bem diferentes, entre forças altamente militarizadas contra populações que apenas possuem meia dúzia de haveres. Aqui a ajuda humanitária chega numa percentagem muito baixa, entre os 20 e 10%.
Segundo o meu marido que já andou por estas paragens, faz-se festa quando se consegue distribuir 20% da ajuda humanitária procedente de anónimos de países ricos ou em vias de desenvolvimento.
Apesar da ajuda humanitária estar de certa forma globalizada ou ser gerida por conjunto de organizações que se conhecem e terem metodologias de trabalho concertadas por hierarquias, torna-se muito difícil trabalhar no terreno nas áreas sociais, como na intervenção de cuidados de saúde, ou na simples reconstrução de escolas, habitações, redes de saneamento, distribuição de água e energia e nas rodovias.
E isto mesmo que se disponha dos equipamentos, materiais e seja da responsabilidade de instituições de grande credibilidade internacional, porque falamos de países que mesmo em estado de paz, o espectro da guerra ou conflito é latente e, na maior parte das vezes, fomentado por forças exteriores com poder nas próprias organizações internacionais.
O êxito da ajuda humanitária que vem quase ou exclusivamente do apelo à solidariedade, acontece muito mais nos países desenvolvidos periféricos como Portugal onde a pobreza escondida aumenta de forma galopante.
Por exemplo, é possível obter certezas sobre a cadeia de distribuição do Banco Alimentar em virtude de se conhecerem os grupos de voluntariado distribuidores, as suas bases territoriais e obviamente as suas bases de dados relativas às famílias que são contempladas com este tipo de ajuda.
A este nível só se torna difícil conhecer os resultados do chamado “Banco de vestuário utilizado” gerido por uma espécie de fundação que recicla a roupa para a entregar a uma cadeia de venda em 2ª mão e daí obter receitas para a ajuda humanitária e que, entre nós, se confina a determinadas áreas de risco.
Falta claramente auditorias oficiais capazes de mostrar a realidade das atividades destas organizações, ou seja falta, afinal, fiscalizar para onde vão os donativos dos cidadãos anónimos que praticam solidariedade.
Por isso mesmo o tema globalização não é nem nunca será pacífico enquanto se registarem assimetrias tão acentuadas – existem os seus opositores populares e governamentais: Os defensores afirmam que ela permite que os países pobres se desenvolvam economicamente, aumentando os seus padrões de vida.
Por outro lado, os seus opositores argumentam que a criação dum mercado livre sem restrições tem beneficiado empresas multinacionais do mundo ocidental, em detrimento das empresas locais.
No Reino Unido, ativos não reclamados ajudam pobres
No entanto, a globalização não generalizou algumas políticas, mesmo entre países da União Europeia, nomeadamente no âmbito da ação social e da fiscalidade.
Por exemplo, no Reino Unido, os ativos bancários não reclamados, até ao penúltimo trimestre de 2010, atingiram os 18 mil milhões de euros. A banca britânica entregou-os ao erário público ainda em Novembro desse ano.
Ou seja os valores depositados na banca não reclamados, há pelo menos entre 10 e 15 anos, pertença de depositantes falecidos e não reclamados são devolvidos à sociedade porque é a ela que passam a pertencer através do Estado.
Mas, neste país dos mais ricos da União e mesmo no contexto mundial, esta verba enorme é investida em políticas de apoio social concretas.
Para os líderes políticos britânicos trata-se de uma questão de lucidez e de contribuir para o bem-estar social. É um dever das instituições bancárias que não se devem apoderar destes montantes que não lhes pertencem e que deles já retiraram, inclusivamente, rendimento por via da própria atividade financeira.
Nos países membros da comunidade europeia, também não se encontra harmonia fiscal relativamente a impostos que recaem sobre as empresas. Quase todos praticam exceções quando se trata de garantir investimento de empresas estrangeiras: fazem-no atribuindo benefícios fiscais, em sede de imposto sobre os rendimentos, e apoios na instalação como a cessação de impostos como a derrama ou similares ou nos montantes iguais ao valor da aquisição dos terrenos.
Neste âmbito e entre os países da União, o caso mais falado envolveu a maioria das maiores empresas portuguesas do PSI 20, ou seja das cotadas em bolsa que passaram as suas sedes ou ‘holdings’ para praças holandesas, afim de obterem benefícios no imposto sobre rendimentos coletivos”.
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