26.5.10

Revolução de Mourinho

José Mourinho chorou abraçado a Marco Materazzi depois da festa em Madrid. O treinador português acabou por sair do carro e voltar a trás para abraçar o jogador italiano que se mostrava inconformado com a saída do treinador – foi um momento singular entre profissionais habituados a triunfar.

O treinador português conduziu o Internacional de Milão a um ano de ouro – o segundo título de campeão, a Taça de Itália e a Liga dos Campeões Europeus, este último conquista que o clube não conseguia à 45 anos.
Dois golos em momentos cruciais, concentração absoluta, atitude positiva, rigor na interpretação do jogo, disciplina táctica e uma fífia da defesa foram o resumo do desempenho do Inter na final de Madrid.
O treinador português consegue o seu 17º título em dez anos de carreira e o quarto nestas duas últimas temporadas em que esteve no clube italiano. E consegui estes resultados num palco adverso, onde era o único estrangeiro no seio de uma legião italiana, depois de aceitar vender o galáctico sueco Zlatan Ibrahimovic, ao Barcelona, de afastar o brasileiro Adriano e o português Quaresma, de trazer à ribalta o talento ofuscado do holandês Wesley Sneijder, Diego Milito, Maicon e o dispensado do Barcelona, Samuel Eto’o.

Estes dois anos de sucesso foi também conseguido muito à custa da experiência (principalmente humana) de dois pilares fundamentais no grupo de trabalho, o argentino Javier Zanetti e o italiano Materazzi, ambos a completarem 37 anos no próximo mês de Agosto.
A estes jogadores Mourinho manteve a confiança no capitão Javier Zanetti que conquistou a Taça da Liga dos Campeões, precisamente no seu jogo 700 ao serviço do Inter. Aliás, o jogador argentino confidenciou que os títulos destes dois anos se devem fundamentalmente ao técnico português, pelos seus métodos, inovação nas relações pessoais e sobretudo na revolução de mentalidades que trouxe ao clube, fazendo do Inter um conjunto verdadeiramente ganhador. Zanetti adiantou ainda que «é compreensível que José Mourinho deixe Itália, porque foi sempre incompreendido e teve sempre muitas adversidades».

Uma marca,
uma referência entre líderes de opinião,
um negociador de crenças

O português ganhou em Portugal, no Reino Unido, agora em Itália… e é natural que o pretenda fazer no competitivo futebol espanhol, onde começou. Por conta de Mourinho, o Inter embolsou dezenas de milhões de euros e vai, pelo menos, receber mais 16 milhões que é o valor da rescisão do treinador português que o Real Madrid terá de pagar ao clube italiano.

Aceitar o convite dos espanhóis não será certamente uma opção espontânea em virtude da estrutura directiva e do grupo de trabalho serem muito complexos de gerir. E não é uma questão de momento. É assim há alguns anos. Estrelas a mais e que se habituaram a trabalhar pouco no campo e muito mais nos estúdios de fotografia.
José Mourinho é a antítese destes circunstancialismos.
Detesta a derrota e não acredita em individualidades no futebol que é um jogo colectivo.
Por outro lado, Mourinho já é marca.
É uma referência entre os líderes de opinião.
A sua presença, o seu carácter, mesmo alguma arrogância no pragmatismo com que fala são marcas muito positivas porque geram resultados e sucesso persistente. E os investidores é isto que querem e pagam o que for preciso.

Portanto o treinador português contratará, em absoluto, com o Real Madrid carta branca para fazer o que bem entender. Foi assim no Chelsea – logo à entrada dispensou Ivan Crespo, o jogador mais caro do planeta à data. Não se preocupou com os inimigos que resultaram da decisão. Fez uma equipa à sua imagem e ganhou quase tudo. Aliás, Mourinho é ainda hoje idolatrado pelos adeptos britânicos. Inglaterra rendeu-se e hoje todos lhe tecem elogios.

Mas Mourinho ainda negoceia e negociará sempre, enquanto estiver num qualquer clube, as condições de trabalho e não somente dinheiro. Ajustará contratações mais humildes de atletas com talento, mas que pode moldar e transformar em jogadores à sua imagem e de eleição. O que se anuncia sobre o Real Madrid pretender Di Maria, Fábio Coentrão e David Luís, todos do Benfica, é muito natural que seja verdade e já opções do treinador português. Di Maria compreende-se porque Mourinho quererá ter uma opção a Cristiano Ronaldo, jovem ainda em tempo de aprendizagem e capaz de evoluir, além dos que já tem no plantel madrileno. Há mesmo quem alimente a ideia que o técnico português poderá ter equacionado a venda de Ronaldo à direcção do clube. Aliás, neste lote poderá ter também incluído o avançado brasileiro Kakà.
Outra das questões que não deverá ter agradado a José Mourinho é o facto de Pepe estar a recuperar à força de uma lesão grave no estágio da selecção portuguesa, com o intuito de jogar no “Mundial” da África do Sul. Para o técnico, Pepe talvez pudesse estar a recuperar com mais tranquilidade com o objectivo de um desempenho elevado na próxima época futebolística.

Mas amanhã começam os vaticínios sobre o que fará José Mourinho a seguir, caso tenha êxito em Madrid (?)
Mourinho é um negociador de crenças!

José Maria Pignatelli

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