Uma leitura legítima – o espírito da lei.
Para que todos conheçam a lei que protege o nosso mosteiro.
Para que todos conheçam a lei que protege o nosso mosteiro.
O que me leva a escrever este artigo é, ainda, o facto de continuarem as obras na zona de protecção do monumento nacional de S. Dinis e S. Bernardo, em Odivelas. Qualquer cidadão, bem intencionado, admitirá que a lei tem o objectivo de defender os monumentos. Se não fosse para proteger de ambições, de agressões ou da ignorância, não seria necessário legislar sobre esta matéria. Isto é lógico e cristalino. Mas não para todos. Se assim fosse, não leriam um pormenor sem justificação, face aos reais objectivos e ao espírito da lei.
Vejamos os artigos e pontos da Lei de Bases do património que realmente o protegem.
A Lei 107/2001 de 8 de Setembro:
Artigo 40, ponto 1 – “Os órgãos competentes da administração do património cultural têm de ser previamente informados dos planos, programas, obras e projectos, tanto públicos como privados, que possam implicar risco de destruição ou deterioração de bens culturais ou de algum modo os possam desvalorizar”.
Bem, parece-me que aquela construção implica” deterioração” e “desvalorização” do “bem cultural” que é o mosteiro e, inclusive, do povoado histórico.
Passemos ao Artigo 43:
Ponto 1 – “Os bens imóveis classificados (…), beneficiarão automaticamente de uma zona geral de protecção de 50 (cinquenta metros), contados a partir dos seus limites externos, cujo regime é fixado por lei.
Ponto 2 - …”devem dispor ainda de uma zona especial de protecção…”
Que dizer a estes artigos? O prédio que está a ser construído fica dentro, e muito dentro, desta zona de 50 metros. Será que o legislador não sabia aritmética, e confundiu 50m com 50 decímetros ou com 50 centímetros? Será que quem deu parecer favorável está, com boa intenção, a corrigir o legislador?!
Avancemos para o ponto 4 – “As zonas de protecção são servidões administrativas, nas quais não podem ser concedidas pelo município, nem por outra entidade, licenças para obras de construção e para quaisquer trabalhos que alterem a topografia, os alinhamentos e as cérceas e, em geral, a distribuição de volumes e coberturas ou o revestimento exterior dos edifícios, (sem prévio parecer favorável da administração do património cultural competente.) ”
Alguém terá dúvidas quanto aos objectivos deste ponto da lei? Alguém entenderá que a frase mais importante deste ponto é a parte que eu coloquei entre parêntesis? Se o legislador estivesse bem consciente do “xicoespertismo” que abunda entre nós, nunca teria acrescentado aquela frase, que vem permitir os maiores atropelos à lei e anular o seu espírito, que é defender os monumentos. E não só o espírito desta lei, até anula o que está dito antes.
Que garantia temos nós, da competência e seriedade de quem deu parecer favorável à construção? Será que veio ao local, que procurou conhecer as memórias do sítio? Não me parece. Que nada sabia das memórias daquela entrada no Largo D. Dinis, tenho a certeza absoluta.
Pois foi apenas a esta infeliz frase que a Câmara deu importância.
Continuemos a analisar a lei.
Artigo 44, ponto1 – “A lei definirá outras formas para assegurar que o património cultural imóvel se torne elemento potenciador da coerência dos monumentos, conjuntos e sítios que o integram, e da qualidade ambiental e paisagística.”
Será que o prédio que venho contestando é que vem dar cumprimento a este ponto da lei?
Nisto não atentou quem deu parecer favorável, nem quem passou licença de construção. Este ponto não é invocado pela Câmara. Continua a insistir naquela infeliz e descuidada frase do final do artigo 43, ponto 4. E com isso, assassina-se a lei. Não é legítimo.
Passemos ao ponto 2, ainda do artigo 44 – “… o Estado, … e as autarquias locais promoverão … a adopção de providências tendentes a recuperar e valorizar zonas, centros históricos e outros conjuntos urbanos, … paisagens, parques, jardins e outros elementos naturais, arquitectónicos integrados na paisagem.
Parece-me que também não é neste ponto que se pode buscar legitimidade. Pelo contrário, dificulta, mostra que a razão não está do lado do lamentável parecer, e em consequência, não cobre a atitude da Câmara. Apenas deixa de ser ilegal, o que na realidade é “ilegal”. Mas a isso não ligou o poder. O poder só leu uma frase, que é um “postigo” por onde entra sempre o erro.
Sim, porque o que é legítimo e legal, entra pela porta grande. Mas foi por uma fresta que deram o golpe mortal a toda a lei. É só esse descuido, que permite dizer que é legal o que, segundo a totalidade do texto, devia ser ilegal. Mas, por mais voltas que dêem, nunca farão desta barbaridade, senão o que é: um produto da barbárie que caracteriza os povos subdesenvolvidos. E a barbárie acha que pode tudo.
Quem poderá esquecer a destruição do museu do Iraque?
Nunca estarei desse lado!
Maria Máxima Vaz
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