O comércio tradicional é a âncora da economia das cidades. E continua a sê-lo apesar da revolução que se fez no comércio sobretudo pela criação das grandes superfícies, conceito onde se juntam lojas de tudo e para todos os gostos ao conforto da mobilidade de maior eficiência.
Nos países do Norte e do Centro da Europa o comércio tradicional adaptou-se principalmente jogando os argumentos da centralidade e da qualidade. Em Paris, as bancas de fruta dos vendedores ambulantes são um dos maiores exemplos de rigor… parece saídas de um filme de princesas e continuam a ser uma das muitas imagens de marca da cidade além fronteiras.
Naturalmente que esta modernização contou com alguns investimentos paralelos feitos pelo sector público, nomeadamente em matéria de mobilidade e de atracções que motivassem o aumento quanto mais não fosse do turismo interno.
Em Portugal também há quem o faça e de várias maneiras. Curiosamente alguns dos melhores exemplos acontecem em concelhos mais pequenos e pobres. Vejamos os casos de Mora com a construção do fluviário, os fantásticos projectos dos centros de Ciência Viva, nomeadamente:
· Do Alviela no concelho de Alcanena, com um fantástico Quiroptário a permitir sessões virtuais que nos transportam a milhares de anos atrás;
· De Constância que nos permite ver o céu “real” em toda a sua grandiosidade, mesmo sobre nós numa sala para pouco mais de vinte pessoas;
· De Sintra que convida à experiência de dezenas de módulos interactivos como uma sala de espelhos genética, reacção e visão de conjunto… (www.centroscienciaviva.pt)
Não menos importante temos o Centro de Interpretação da Batalha de Aljubarrota no concelho da Batalha, um excelente exemplo a seguir para contar a história e histórias de D. Dinis... que – imagine-se - é visitado por milhares de espanhóis (fundacao-aljubarrota.pt).
Mas quer se queira ou não, a economia suporta-se também nas questões infraestruturais. A mobilidade é a maior. Uma preocupação transversal a todos os grandes meios urbanos. Naturalmente que há excepções e bastantes. Todas aquelas cidades que viram os seus autarcas preocuparem-se com estas questões atempadamente, que tiveram a capacidade de prever o futuro e planear.
Este tema passou a fazer parte das prioridades dos políticos, urbanistas, comerciantes, industriais e grupos de cidadãos mais ou menos anónimos com ou sem deficiências no final da década de 50 e princípio dos anos 60, particularmente entre os que viviam nos meios urbanos mais penalizados pela segunda Grande Guerra.
Foi preciso reconstruir cidades, afastar os receios de uma pobreza extrema e persistente.
Precisou-se pensar depressa e bem para que as novas cidades perdurassem no tempo de forma a adaptarem-se ao crescimento populacional que era expectável.
Conseguiram-se exemplos de sucesso. A metade de Berlim que foi gerida durante 50 anos pelo Ocidente foi uma delas, particularmente pelos eixos viários e de transportes que se criaram, bem como a renovação de infra-estruturas desportivas – o antigo complexo Olímpico da era de Hitler é exemplo do que melhor se pode fazer em matéria de reabilitação - e criação de novas com o objectivo de fomentar as actividades sócio culturais e desportivas. Recordo o elevado número de piscinas públicas (uma por bairro) que são fundamentalmente tanques de aprendizagem. É que em Berlim na década de 90 todos eram obrigados a saber nadar a partir dos sete anos.
Mas a mobilidade encontra desenvolvimentos ímpares na maioria dos países da Escandinávia, no centro da Europa, como no Luxemburgo, na cidade alemã de Colónia, na Suíça ou na Áustria.
Franceses na frente
Mais recentemente os franceses ensaiaram modelos quase perfeitos a partir principalmente do transporte ferroviário, onde são líderes europeus há décadas. A melhor lição é dada em Nantes, a sexta maior cidade francesa a Oeste daquele País onde importava, por um lado aproximar as duas margens do rio Loire, a própria Ilha de Nantes, por outro preservar o centro da cidade, o património, o comércio tradicional e os serviços, retirando parte significativa do tráfego automóvel.
Tratou-se de ajudar a economia local de uma cidade que se tornou opção de desembarque para mais de um milhão e meio de passageiros que anualmente fazem voos transcontinentais, sobretudo em companhias lowcost, com destino a Paris. Aí entrou o TGV em ligações a Paris ou a Orly (esta última cidade também ela uma plataforma entre vários transportes intercontinentais).
O poder local em Nantes percebeu que este fenómeno fez disparar o turismo e aí as empresas locais, particularmente o comércio, encontraram nova oportunidade em aumentar as receitas. Daí a necessidade de tornar o centro da cidade mais atractivo com maior qualidade de vida.
Iniciou-se um projecto de mobilidade cruzando três géneros de transporte com uma gestão integrada. O resultado foi excelente. Em Nantes a mobilidade é quase perfeita. No centro da cidade deixaram de circular mais de 40% dos automóveis particulares que o faziam em 2001. Um só bilhete, um só passe ou um só grupo de bilhetes ou passe(s) adquiridos localmente em máquinas automáticas, em postos do turismo ou ainda na internet, permitem circular e mudar de transporte as vezes que se pretender durante o dia ou durante uma semana.
Vencem os comerciantes e o centro da cidade
Ganharam todos: os que habitam na cidade, os que a visitam, os agentes económicos particularmente o comércio tradicional e os responsáveis que obtiveram o mais importante prémio internacional para projectos de mobilidade concretizados.
No passado fim-de-semana, numa reportagem apresentada pela TVI e realizada por jornalistas da estação, percebemos que este programa se concentra na utilização do metro de superfície, do busway (autocarros com eficiência energética com elevados padrões de conforto) e do barco e na gestão integrada onde se encontram dois call center (centros de comunicações) que permitem fazer a gestão dos passageiros nas várias linhas destes transportes prestando as mais detalhadas informações e a própria gestão da circulação e do parque circulante.
O sucesso deste projecto é mesmo a gestão aplicada que responde às maiores preocupações – eficiência, segurança, cumprimento dos horários, conforto, economia, eficácia energética e contribuição para a melhoria ambiental.
Sinal positivo ainda para o facto de em paralelo ser possível fazer a gestão de transportes ocasionais requisitados por pessoas de menor mobilidade ou moradores em locais fora das rotas dos transportes habituais que conseguem servir diariamente mais de 1100 cidadãos.
Não menos extraordinário neste programa é o facto da adaptação dos veículos às novas tendências como por exemplo a utilização de unidades a gás natural a única alternativa imediata aos combustíveis derivados do petróleo e que no futuro evoluirão para viaturas híbridas, gás natural e electricidade com a vantagem da maior mobilidade pelo facto de não terem catenária.
Em Nantes a rede de Busway é a mais recente – data de Novembro de 2006 precisamente 21 anos depois da instalação da rede de Tranway, o metro de superfície.
A rede de Busway é o primeiro sistema francês de autocarros em via exclusiva, estende-se por 6 quilómetros e possui 15 estações, enquanto a rede do metro de superfície desenvolve-se por 3 linhas que totalizam quase 42 quilómetros com mais de 90 estações.
O Busway circula à velocidade média de 20 km/h e precisa de 20 minutos para cumprir o trajecto. O intervalo entre partidas dos veículos é de 3 minutos nas horas de ponta e de 7 minutos no período normal do dia. Neste sistema são utilizados 20 veículos todos iguais - autocarros articulados com piso rebaixado construídos pela Mercedes Benz sobre o modelo Citaro movidos a gás natural, também conhecidos entre nós, mas com design exclusivo para a rede de Nantes(ver imagem).
As vias dedicadas – espaço canal – são uma espécie de tabuleiros nas zonas centrais das avenidas sem recurso a quaisquer separadores. Em algumas artérias da cidade o Busway circula em vias paralelas às utilizadas pelos veículos automóveis convencionais.
No centro da cidade habitam cerca de 290 mil pessoas e no total da área metropolitana o número ultrapassa os 805 mil. Todos os dias, mais de 300 mil residentes utilizam os transportes públicos.
José Maria Pignatelli
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