18.10.11

Muitas explicações de fora do orçamento

Vítor Gaspar, ministro da Finanças demonstra o seu lado iminentemente técnico, frieza em demasia e algumas justificações contraditórias para que o maior esforço da austeridade recaia sobre a função pública e quem exerce cargos públicos, como o facto dos funcionários públicos serem mais difíceis de despedir. Nada mais falso: os trabalhadores a tempo indeterminado também se incluem num mapa de pessoal que tem de ser, obrigatoriamente, aprovado anualmente. Assim sendo, bastará uma alteração da designação do serviço para que a situação laboral do funcionário se altere. Seria de bom-tom que o ministro das Finanças cuide destes detalhes técnicos, sob pena de se confundir com alguns dos seus antecessores que fizeram da Lei ‘letra morta’ e de espelhar um registo que não foi o que apreendeu, certamente, enquanto andou nos bancos da escola.
Na apresentação das linhas orientadoras do Orçamento Geral do Estado para 2012, Vítor Gaspar também não esclareceu:
A verdadeira dimensão da divida pública;
Da despesa prevista para 2012;
Do efeito da divida privada sobre as contas do Estado;
Do futuro do sector empresarial do Estado, institutos públicos, fundações e outros organismos;
Do que pensa sobre algumas das maiores empresas portuguesas terem domicílio fiscal fora do País;
As razões que mantêm a banca num patamar contributivo inferior.
Pensões dos antigos políticos fora da austeridade
O documento mostra também que a maioria dos antigos titulares de cargos políticos ficará isenta do esforço especial adicional em sede de medidas de austeridade, nos seus subsídios vitalícios: é que a proposta de lei do Orçamento do Estado, apenas prevê ficar com o 13º e o 14º mês das subvenções. Por isso a medida não terá nenhum alcance para as subvenções vitalícias dos antigos políticos que apenas as recebem por 12 vezes em cada ano. Também não se vislumbra nenhuma medida que reduza estas mensalidades em 10% tal qual já sucede com os restantes funcionários públicos. Convêm assinalar que estes subsídios são pagos aos ex-políticos que exercem outras profissões. A medida revela-se incompreensível: deixa de fora a antiga classe política num momento em se pede austeridade a todos os pensionistas que auferem mensalidades acima dos 485 euros. Provavelmente a maioria dos eleitores que acreditaram neste governo aguardavam por uma verdadeira equidade na distribuição do esforço para debelar a crise profunda em que o País se encontra mergulhado.
Cortes nos subsídios são de 112,5% ou 111%
Por explicar está o mecanismo utilizado para retirar os subsídios de Férias e de Natal de 2012 e 2013. Aparentemente far-se-ão pela mesma via da redução que irá ser operada ainda este ano: por força da aplicação extraordinária de uma taxa de IRS.
Significa isto que ao processar o vencimento, aplicam-lhe uma taxa de 100% de IRS e ainda processarão o abatimento de 11% para a CGA, Caixa Geral de Aposentações e 1,5% para ADSE (ou só 11% TSU para quem não tem ADSE e CGA)...
Assim, ao invés de um abatimento de 100% estaremos na presença de um abatimento de 112,5% ou 111%.
A visão de André Macedo
De qualquer modo, registo o editorial de ‘Dinheiro Vivo’, do Jornal de Notícias, da autoria de André Macedo que em poucas linhas nos permite uma visão do Orçamento para 2012 e da orientação do próprio governo.
Vítor Gaspar começou a apresentação do Orçamento do Estado com um agradecimento aos técnicos que prepararam o documento. Interessante este ministro das Finanças: agradece aos técnicos - como ele - e é incapaz de oferecer uma palavra aos pensionistas e aos funcionários públicos que vão perder até quase 25% dos rendimentos em 2012 e 2013.
Não se pretendia que o ministro fizesse um discurso falsamente sofrido, bastava uma explicação em que reconhecesse o peso brutal do sacrifício numa parte da população, enquanto a outra (a privada e no activo) é poupada, em grande medida, a este esforço. Só esse reconhecimento já teria sido um bom sinal.
Este Orçamento, apesar de incorporar um pacote de medidas históricas para equilibrar as despesas públicas às receitas (e, nesse sentido, é muito bem-vindo), mexe com um ponto sensível do País: a solidariedade entre as pessoas. Penalizar pensionistas e funcionários públicos não é uma escolha técnica, é uma opção política e económica da maior importância que deve ser explicada e, por isso, assumida para que seja avaliada por todos e votada no Parlamento. Até agora, o que foi dito por Vítor Gaspar é politicamente insuficiente. E o que foi dito por Passos Coelho é, para já, tecnicamente inconsistente.
Na entrevista de ontem à RTP1, Gaspar chegou a dizer que a distribuição dos sacrifícios vai ser equitativa. Como é possível dizer isto? Ética e aritmeticamente é errado. Onde quero chegar? Que a redução do Estado não é apenas uma urgência. Há aqui uma escolha que podemos ou não aceitar por inteiro. Mas para saber se este é o caminho certo ou inevitável, o Governo tem a obrigação de deixar claro que país tem em mente, quais as funções do Estado que vai manter e quais as que pretende extinguir. Até agora não o disse, limitou-se a cortar, como o anterior se limitou a gastar
”.
José Maria Pignatelli

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